O campo de aviação

O jornalista Fábio Trancolin conta um pouco da história de Rio Verde em crônicas


As histórias do início do aeroporto sempre ouvi na minha casa, elas sempre fizeram parte da minha família. Meu pai nasceu lá, não onde está hoje, mas onde se localiza o Parque de Exposição, ali era o campo de aviação chamado de Aeroclube de Rio Verde. Que teve como presidente e sócio fundador Epaminondas Portilho (Nego Portilho), João Ford era o mecânico dos aviões e piloto. No dia que o pai nasceu caiu um avião no quintal da casa dos meus avós e derrubou um pé de limão (ninguém morreu) pilotavam um ‘Paulistinha’ o instrutor e uma aluna. Henrique Nogueira Duarte (Meu avô) era o ‘guarda campo’ e responsável pela manutenção do aeroporto, ele zelava e cuidava de tudo por lá, juntamente com a minha avó Dª Maria Abadia.

Meu pai conta que a mãe dele era uma daquelas pessoas que fazia de tudo e estava sempre disposta. Ela acordava muito cedo e fazia as quitandas e também para ‘abater’ as encomendas dos tripulantes dos aviões da Nacional Transporte Aéreo que passavam por aqui naquela época. Essas encomendas eram galinhas caipiras, meu avô saia de carroça comprando os galináceos pela região, em média eram de 15 a 20, minha avó levantava muito cedo, e o fogo ela deixava acesso antes de dormir, e quando levantava antes das 04:00 o tacho estava com a água fervendo, ele fazia o serviço e quando o avião que ia pra o Rio de Janeiro passava 08:30, estava tudo preparado, e às 10:30, via o que iria para São Paulo. O pai conta que as aterrissagens desses aviões eram ‘festa’ na casa dele, num tempo em que a população de Rio Verde não tinha acesso à maça e banana nanica, na casa dos meus avós essas iguarias fazia parte do cardápio. E pão de forma e ‘mussarela’ também eram outras coisas que sempre tinha por lá, e era desconhecido pela maioria. Eram oferecidos com lanche nas aeronaves e a tripulação presenteava os meus parentes.       

No período em que Jerônimo Martins foi prefeito de Rio Verde, houve uma desavença com o meu avô e ele foi proibido de entrar no aeroporto, com a chegada de Astolfo Leão Borges ‘Bebé Borges’ em 1951 ao poder, as coisas mudaram e ele pode voltar a exercer as funções. Minha avó desencarnou no dia 04 de dezembro de 1952, e mesmo viúvo o ‘Henriquinho’ ficou no aeroporto, o meu pai era o último filho na escala de oito filhos, nesse tempo ele tinha 11 anos, e então ele foi morar em Goiânia na casa da Madrinha Dona Maria Silveira esposa de Pauzanes de Carvalho, naquela época a capital do estado era uma ‘adolescente’ tinha apenas 18 anos.

Mesmo com o retorno da minha avó para o Plano Espiritual o meu avô ficou por uns anos no aeroporto, e deixou à função em 1957, ele foi para São Paulo, ele sempre gostou muito de loterias, e vendia bilhetes, essa foi uma marcada registrada dele, depois retornou para Rio Verde, era uma figura conhecida e muito querida. O ex-prefeito Lauro Martins quando ganhou o primeiro prêmio na Loteria Estadual foi o Seu Henriquinho que lhe vendeu o bilhete, e muitos outros tiveram a sorte através do meu avô. Na década de 70, outro ‘Nogueira Duarte’ assumiu o cargo que fora outrora do meu avô, meu tio Anaetes morou por um tempo no aeroporto.

E nos finais de tarde na estradinha de areia lá íamos nós rumo ao por do sol nos ‘fusquinhas’ branco, azul que o pai teve naquela época. Subíamos a estrada de ‘areião’ que começava logo depois da ponte do córrego do sapo e passava na porta do Clube Campestre, ali terminava a cidade, era cerrado preservado. Na porta da casa do meu tio tinha um pé de Jatobá, era diversão para as crianças, ele era pai de três meninas, e um tanto quanto sistemático, e na minha casa três meninos ele não gostava muito da ideia de brincarmos com as primas, mas era um período de ingenuidade, mas ele não via assim, dizia ele ‘menino pra lá, menina pra cá’. Na casa era de chão batido e cercado de pau a pique, e de uma limpeza de causar inveja a muitas casas de cimento e paredes, os utensílios domésticos de tão limpo brilhavam que o rosto refletia no fundo da panela.

Era festa ver os aviões subirem e descerem na pista ao longe que era circundando pelo cerrado preservado, na época dos cajuzinhos o povo invadia o campo cheiroso num final de tarde na cata do fruto delicioso no tom amarelo e vermelho que enchia as latas, as gabirobas e as pitangas enchiam a mão da molecada, que corriam no meio das árvores retorcidas num abraço da mãe natureza. E assim o aeroporto fez parte da minha infância.

Foi apresentado um projeto na Câmara Municipal para que em homenagem ao meu avô Henrique Nogueira Duarte, então esse seria o nome do aeroporto de Rio Verde, o projeto foi arquivado. Mas quem conhece a história e sabe do carinho que o meu avô tinha por aquele pedacinho de terra e o tanto que ele fez por aquele lugar, essa é a grande homenagem. ‘CAMPO DE AVIAÇÃO HENRIQUE NOGUEIRA DUARTE’.

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