Contando histórias: Nos tempos da bela infância

O jornalista Fábio Trancolin conta um pouco da história de Rio Verde em crônicas


Lendo o livro de recordações que está guardado na memória, retorno mais uma vez nos tempos da bela infância... Tanto tempo passou, anos e anos vão se acumulando na contagem da ampulheta do tempo, a areia esvai-se... Bateu saudades do tempo da pequena cidade, e dos meus amigos. Eu voltei ao passado, e lembrei de vocês... E me vejo na quadra do Tiro de Guerra, ah! Como eu gostava do TG, lá eu passava os meus dias, não importava se era segunda ou sexta, domingo ou feriado... Lá estava eu com o meu kichute, camisa do Palmeiras e o calçãozinho verde, esse era o meu uniforme... Como eu era feliz, com os meus gols gritando ‘Toninho do Palmeiras’... Eu morava no casarão branco da Rua 12 de outubro, com um quintal enorme e suas jabuticabeiras e mangueiras... 'Frutas em qualquer quintal, portas e janelas ficam sempre abertas...'

Um pouco abaixo ficava a casa do Junior, ponto de encontro da molecada, o portão estava sempre cheio, lá reuniam todos, o Eder, Ki-suco, Mário, Batata, Peru, Tigre, Buião, Rogério, Sergio, Paulinho Rola, Silvano (Careca), Duti, Cleomar, Afonso Gambá, Chininha, Murilo, Cleber, Carlinhos Queijinho e o Jairinho... Eram tantos, desculpe por não ter citados todos, mas com certeza estão guardados na memória da emoção. A cadeia velha (Hoje o Palácio da Intendência), palco de tantas brincadeiras, os morcegos que ao cair da tarde abandonavam os seus esconderijos e saiam em revoadas, sempre tinha alguém para derrubá-los com as camisas ao vento, eles saiam e os pardais voltavam em barulhenta algazarra... O tempo urge, mas nesse caso ele ‘ruge’, ele te chama para ver que o tempo voa... Vem andar e voa...Vem andar e voa... As mudanças vêm, sempre vieram... Mas, naquele tempo elas demoravam a chegar, ou não percebíamos... Sonho semeando o mundo real. E hoje na ‘descartabilidade’ de tudo, até o ser humano é descartável... E é bom de vez em quando parar e analisarmos essas mudanças... Gosto de recordar... Da janela da cadeia velha vejo ao fundo o cerrado, vê o horizonte deitar o chão... Da janela o horizonte... A liberdade de uma estrada eu posso ver... O meu pensamento voa livre em sonhos... Aos poucos as mudanças começaram com algumas casas em frente ao campestre e se transformou no Solar Campestre e de repente tantos bairros novos... E o Solar invadiu o nosso espaço (não foi com os raios de sol, foi com pedra e concreto), as desbarrancadas e seus mistérios na madrugada. O jatobá, o velho jatobá, acabou não existe mais, no tempo das brincadeiras de ‘polícia e ladrão’ ele era o QG.

Descendo um pouco mais tinha a quadra dos bancários, o Seu Dulcíndo e a sua família tomavam conta do clube, os filhos com seus nomes diferentes para época, Frankcione, Dulcinéi e Ericsson, a filha o nome era mais fácil Eliana... E falando em Clube dos Bancários lembro-me de um fato, os meninos fizeram um buraco na lateral dos vestiários, esse furo foi feito com um cabo de vassoura, só que esse plano foi por água abaixo, sacanagem alguém viu, e na minha vez eu não consegui ver nada, alguém me viu, gritou (tem alguém olhando)... Ouviu-se um grito, pega! Só viu moleque correndo... Só via pé de mamona quebrando... Outro caso que vem na memória foi o desacato ao Sargento Barbosa, na frente da tropa eu mandei ele ir pra aquele lugar... Foi de momento, coisa de menino, só que eu tive que correr, e correr muito, se ele me pegasse eu estava perdido, sorte que ele não me alcançou... Também eu e o Mário (filho do sargento) brigávamos duas vezes por dia e naquele dia ele mandou o filho me acertar uma pedrada, pois nos tapa, ele tinha levado uns tabefes, ele atendeu ao pedido do pai, e eu desembestei a distribuir palavrões... Como nos brigávamos... É bacalhau...! Mas no fundo nos adorávamos, o velho parceiro de bola... Depois eu fui até a casa dele e pedi desculpas...

O Junior era o bom companheiro, na infância, na adolescência, sempre estivemos juntos, o meu velho e bom amigo... O meu grande amigo... Ele tinha uma bicicleta amarela que não tinha garupa, eu andava na guidom e imitava uma sirene (já imaginou a cena?). Sempre íamos para a Praça Mariano para aprontar, como aprontávamos. Lembro de uma vez, nós estávamos lá e alguém teve uma ideia... Vinha um cara subindo a rua e estava sozinho...O plano era o seguinte, eu deveria ficar sozinho e xingar o cidadão, enquanto os outros ficariam escondidos... Assim foi feito, xinguei o individuo, ele me viu sozinho pequeno e magrinho, e veio todo nervoso e alterado, porém quando ele chegou perto, todos saíram de seus esconderijos, perguntando se ele iria bater no menino, a cena foi hilária... E eu parecendo um pombo com o peito estufado.  

Na sexta-feira tinha seresta no clube campestre, e lá estávamos nós na ponte do córrego do sapo, com as nossas bombinhas e rojões, para azucrinar quem por lá passava em direção ao clube... A molecada não tinha ideia... Era bomba pra tudo que era lado... Também tinha os nossos amigos da vila do matadouro, gente boa aquela... Atravessávamos a pinguela do córrego do sapo e chegávamos nas represas... Passávamos pelo córrego galinha, naquela época não existia a rodoviária, tudo aquilo era pasto e nosso espaço, não havia a Morada do sol, a Presidente Vargas terminava na curva para o cemitério, as gabirobas e os araticuns... O sonho de matar um anum preto (coisa de moleque...) As alfaces do Takecho, era um japonês que cultivava uma grande horta, e a molecada saia vendendo alface em grandes bacias... O tempo passou, passou, mas não dá para esquecer... Que saudades daqueles tempos... Nós não tínhamos dinheiro, mas para que dinheiro o que nós tínhamos dinheiro não comprava...

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