Contando histórias: A Casa das Louças

O jornalista Fábio Trancolin conta um pouco da história de Rio Verde em crônicas


Estava sentado num banco da praça da matriz e com olhos que contêm o olhar antigo, me vi menino. E como todo menino da minha idade tinha um sonho de brinquedo. E falar em brinquedo naquela época, um nome povoava o nosso imaginário, ‘Casa das louças’. O paraíso da fantasia de menino pobre ou abastado. Vejo o velho e bom amigo Ernesto Pagirys no balcão com o seu tom de voz ‘barulhento’ inconfundível.

Quando eu ia para a escola na sua porta passava, e ali sonhava com a bicicleta que ficava exposta na porta. E por falar em escola, no meu caminho educacional ela também esteve presente, o ano era 75, quando eu iniciei os meus estudos, os cadernos, a pasta, lápis e borrachas meu pai comprou nas Casa das louças. As ‘canetinhas Sylvapen’ também foram compradas lá, o meu estojo tinha apenas seis, como eu sonhava com a de 24 cores...

Vai casar, noivar, é o dia das mães, aniversário de alguém, era só ir até as casa das louças que o presente iria encontrar... Mas bom mesmo era o dia das crianças e o maravilhoso natal. Podia ter certeza que alguma coisa de lá viria, sempre algo vinha. Numa época em que brincar de bandido e policia era pura ingenuidade, até revólver de espoleta eu ganhei... O som da sirene do ‘bate e volta’ no seu barulhinho e bate aqui e bate lá... Pacotes de indiozinhos e soldadinhos...  Ferrorama... Autorama, tênis bamba... De tudo se encontrava por lá...  No amontoado de brinquedos e utilidades que o cheiro do nariz não sai, ficou impregnado nas ‘narinas ‘ da memória. A família Pagirys ali trabalhava, Dona Zilá, Dona Hilda, e vários vendedores por lá passaram, e um dos que se destacava, era o Leonardo, menino bom filho da Dona Deolinda.

Lembro dos natais, na praça em frente se colocava as lâmpadas coloridas, não era pisca-pisca ‘Made in China’ eram lampadinhas azul, amarela, verde e vermelha... São das mesmas cores dos carrinhos do meu autorama que ainda tenho guardado e que ganhei no natal de 1974... Um belo presente e inesquecível que o pai me deu depois que eu fiquei alguns dias hospitalizado. Meu irmão mais velho ganhou um bate e volta policia, e o mais novo um jipe (aquele que a criança entrava e tinha os pedais do vai vem e você movimentava e fazia ele andar).

Porém um dia o sonho acabou... No inverno de 2000 as labaredas do fogo infernal nosso sonho consumiu... As lágrimas que dos olhos escorriam não conseguiram o fogo apagar... Ainda tenho na memória imagem do desespero do amigo Ernesto (menos de um mês depois ele também se foi), vendo a loja ser consumida, o que durante tantos anos de árduo trabalho fora estabelecida... Das viagens de Kombi que pela redondeza ele fazia... O fogo lambia numa voracidade implacável... Eu assistia a tudo sentado na porta da casa do saudoso prefeito Iron Jaime... Acabou... Terminou... O cheiro da infância de papel, plástico e presente deu espaço para o cheiro de fumaça... Levantei fui embora e não olhei pra trás...

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