A Lagoa Santa que de santa não tinha nada...

O jornalista Fábio Trancolin conta um pouco da história de Rio Verde em crônicas


A turma da 7ª e 8ª série do Colégio do Sol fez uma viagem inesquecível no ano de 1985. A galera reuniu e resolveu que faria uma excursão na semana santa, destino Lagoa Santa. Quem estava no comando eram os professores Osmar (História) e Agrest (Ciências). Data e local definido começaram as reuniões para estabelecer as regras de como seria e o que podia e o que não podia. Numa delas houve um desentendimento entre o Claudenir e o Roberto, o Osmar excluiu os dois, talvez para ali mostrar que ele estava no comando, fiquei sentido, pois os dois eram (e é) meus amigos. Cinco de abril seria sexta-feira santa, essa seria a data então. Tudo organizado, ônibus contratado, porém o Agrest teve que se ausentar e viajar, a mãe dele não estava bem. Esse fato deixou a turma chateada, como o professor não vai, ele que era um dos mais animado. Reunimos e foi decidido, sem ele não tem viagem, resolvemos então adiar a data, e assim foi feito, iremos em junho, houve consenso e assim ficou definido.

Chegou junho a galera ansiosa pra viajar, não se falava em outra coisa naqueles dias. Na noite do dia 13 uma 5ª feira o ônibus estacionou na porta do colégio. Antes de embarcar o Selmo, Manoel e eu fomos num bar que ficava na Presidente Vargas para dar uma esquentada, aproveitei e comprei um pacote de Galaxy, não era o cigarro que fumava com frequência, mas resolvi comprar esse (Era cigarro especial pra viagem especial, como se houvesse cigarro especial, eu pensava assim naquela época, afff...). E com as mochilas nas costas reunimos aos outros, que já estavam no ponto. Lista de chamada para confirmar se todos estavam lá (e não estariam...)... Adalto, Agrest, Ailton, Aloisio (Japonês), Antônio Jonas, Celestino, Célio, Clayton, Edno (Baiano), Gato (não me lembro do nome dele, só o chamávamos de gato por ele ter os olhos verdes ‘zoio de gato’), Gerson (Cigano), Jairinho, Manoel, Nilton César, Odair, Osmar, Selmo e o (irmão do Gato que pediu uma carona até Itajá, mas acabou indo junto e por lá ficou). As meninas, Ana Lúcia, Aparecida, Márcia, Mariana Emília, Marina, Marta, Lúcia Helena e a Zilma. E desses que lá estiveram dois já não está entre nós, o Cigano e o Baiano, voltaram para o Plano Espiritual.

A ‘jardineira’ pegou o caminho, BR-060, GO-184 e 240 km a percorrer... No meio da viagem alguém descobriu que o Aloisio tinha levado uma farofa, produzido pela Dona Carmem mãe do Nakayma, eximia cozinheira, ele iria comer sozinho, mas no meio de mais de vinte esfomeados só deu um bocado pra cada e o Japa teve que dividir... Ao amanhecer estávamos lá. A casa alugada, não era bem uma casa, chamemos de ‘tapera’, mas isso era o que menos importava ela iria nos abrigar naquele final de semana. As meninas definiram em que lugar ficar, meninos de um lado meninas do outro. Levamos muitos pães e ovos na primeira manhã acabaram os ovos, só o Agrest comeu meia dúzia. Cachaça tinha e tinha muita, todas as garrafas que eram esvaziadas eram amarradas numa árvore que tinha na porta da casa, no dia da volta contamos o cacho que foi feito, pasmem, 49 garrafas de velho Barreiro. Também foi o pior frio que eu passei na minha vida, até hoje não senti um frio tão intenso quanto aquele, e pra esquentar só pinga mesmo... Uma das garotas estava com um batom especial e disse que era para proteger os lábios do frio, alguns dos desavisados passaram o tal do batom, que não saia nem com reza ‘braba’ e era uma cor atraente, o motorista foi um dos primeiro a passar...  

Ah, na Lagoa naquele final de semana, a nossa galera, e uma turma de Minas Gerais que acampou por lá. Mas, se fomos então tínhamos que aproveitar, e aproveitamos. A lagoa água quente, mas quando saia tinha que ser socorrido por um amigo com uma toalha aberta, o vento cortava. Mulheres e homens não se misturavam, revezavam e a cada hora o sino tocava avisando o rodizio, a noite era liberado, mas que estava doido pra entrar na lagoa com um frio daqueles. À noite, todos no bar do japonês só tínhamos esse lugar pra frequentar, isso e mais nada, hoje a cidade é organizada, na década de 80, não era tão bem preparada, era mais um vilarejo. ‘Há um vilarejo ali. Onde areja um vento bom. Na varanda, quem descansa. Vê o horizonte deitar no chão... Lá o tempo espera...´

Pra dormir nada de cama, eram colchões e cobertores colocados no chão e aquela ‘montoeira’ esparramados, como um quarto estava destinado para as garotas os meninos ficaram com mais um quarto, sala e até na cozinha tinha gente deitada. O Célio levou um casaco de pelo de carneiro, e colocou no canto, o irmão do Gato que ficou de fogo todos os dias, numa noite, vomitou naquele canto e depositou todos os dejetos no pelego do amigo Célio, pensa num ‘homi brabo’... Outro fato a ser lembrado foi o Aloisio que se engraçou com uma nativa, e ela o convidou pra que ele a levasse em casa, ele perguntou fica aonde? Ela disse é ali... E lá foi o japonês acompanhar a garota, e na alta madrugada, anda que anda e nada de chegar à casa da distinta, ele na expectativa do que iria rolar de repente ela falou chegamos, tchau... Só restou ele voltar sozinho com o ‘nunchaco’ nas mãos e sendo assustado pelos fantasmas imaginários da noite fria... O Manoel e o Selmo resolveram atravessar o Rio Aporé a nado, só podia ser coisas de dois sem noção, a lagoa a água era quente, no rio água gelada e frio cortante. O Osmar lançou moda andava de cá pra lá de ‘cuequinha vermelha’, o Baiano estrilou com o fato e resolveu que também iria andar igual ao professor, porém a cueca dele era aquela que vinha em copinho e era transparente, cena ‘dantesca’...  No almoço íamos buscar maracujá no Mato Grosso do Sul, atravessamos a divisa e o fruto era trazido do estado vizinho.

O domingo chegou 16 de junho, era dia de jogo das eliminatórias da Copa do Mundo, fomos assistir ao jogo no bar do Japonês. Naquela época valia a pena assistir a um jogo da Seleção, os comandados do mestre Telê eram todos craques, Zico, Sócrates, Junior, Falcão e Eder e outras tantas feras, jogo difícil no Paraguai, o Brasil ganhou 2x0, gols do Casagrande e um golaço do Zico, aquilo foi uma maravilha para o flamenguista Agrest, ele gritava e vibrava com o gol do galinho, parecia o Galvão Bueno gritando, é craque, é gênio! (e de fato ele era craque). Daquela turma que foi na viagem, três casamentos saiu dali, Ailton e Aninha (hoje tem quatro filhos), Tom Jonas e Lúcia, e o Manoel e a Marta, que até então era noiva, mas se encantou com o Manelão, ‘paixonou’, dois anos depois casaram e estão até hoje... Aquele foi um final de semana que entrou para história, sempre que se encontra alguém que fez parte do passeio tem boas lembranças e boas risadas.

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