Wagner Guimarães abriu caixa preta sobre a Prefeitura de Goiânia

Em entrevista ao jornal Diário da Manhã, o peemedebista afirmou “ser contra a aliança com o PT”


O ex-deputado estadual e ex-Controlador do Município de Goiânia, Wagner Guimarães, deu entrevista polêmica hoje ao jornal Diário da Manhã. Nela, ele explicou os motivos da sua saída, e afirmou não querer aliança com o PT. Confira a seguir a entrevista na íntegra:

O peemedebista Wagner Guimarães, ex-controlador-chefe do município de Goiânia, entregou carta de demissão ao prefeito de Goiânia, Paulo Garcia, no último dia 31 de outubro. Na carta, Wagner expôs que deixava o cargo em função do esvaziamento da pasta sob seu comando e também por não concordar com práticas de irregularidades praticadas na Prefeitura de Goiânia. Entre elas, citou a grande ocorrência de fracionamento de despesas na administração direta e indireta e substituição de documentos em processos que se encontram em tramitação. Nesta segunda entrevista ao Diário da Manhã, Wagner dá mais detalhes de sua surpreendente saída do Executivo. Logo na primeira resposta, ele sintetiza o motivo principal: não encontrava respaldo no prefeito Paulo Garcia. O ex-deputado também fala que outros secretários não aceitavam as diretrizes de sua pasta. As críticas ao prefeito Paulo Garcia desta vez ficam nítidas. Wagner diz que o petista transferiu funcionários sem avisá-lo e quando foi comunicado sobre os fracionamentos de despesas não teria demonstrado vontade e iniciativa de conter essas irregularidades dentro da administração. Na página seguinte, Wagner revela o dia em que saiu da pasta. O peemedebista se irritou com o procedimento adotado pela secretária de Educação, Neyde Aparecida, que não cumpriu o protocolo e queria que Wagner aprovasse uma contratação às pressas – apagando as negativas anteriores. “Neste dia, entreguei minha demissão ao prefeito Paulo Garcia”, diz. Os desdobramentos não param por aí. Ele agora defende a quebra da aliança com o PT e diz que, em nome de vencer a eleição, o PMDB não pode ser conivente com irregularidades. As declarações de Wagner vão ressoar em ambos os partidos. Ainda existe uma ala peemedebista que defende candidatura própria e não apoiar Paulo Garcia. A decisão final passa por Iris Rezende, que mantém uma amizade de muito anos com Wagner e que certamente vai levar em conta as revelações do amigo sobre o descontrole na Controladoria do Município.

DM – O que mesmo levou o senhor a pedir demissão do cargo que ocupava?
Wagner Guimarães – É simples, minha atitude está em coerência com minha trajetória de vida e prática política. A Controladoria é o órgão da prefeitura que se incumbe de garantir a legalidade dos atos internos do Executivo municipal. Durante minha curta gestão, que foi de junho até o dia 31 de outubro de 2011, procurei exercer o cargo de controlador de forma que os princípios da moralidade, transparência, publicidade e eficiência da gestão pública fossem respeitados e seguidos pelo município de Goiânia. A partir do momento que vi que minha ação não encontrava respaldo do prefeito e que alguns secretários do Executivo Municipal não aceitavam as diretrizes da boa governança, resolvi me afastar.

DM – Correram algumas versões sobre sua saída, como possível candidatura à Prefeitura de Rio Verde e falta de identidade política com Goiânia. Isto procede?
Wagner Guimarães – Sobre ser candidato a prefeito de Rio Verde afirmo que não sou, posso até a vir a ser, mas no momento isso está longe de meus planos. Sobre a Controladoria precisar de mais agilidade, afirmo que em momento algum aquele órgão travou a administração, ou produziu menos do que historicamente produzia. É bem verdade que tentaram boicotar nossa administração, mas felizmente, mesmo com as dificuldades que colocaram em nosso caminho, conseguimos dar agilidade à Controladoria e mantivemos o ritmo que a Controladoria apresentava. Deixo com você documento produzido pelo departamento de informática da Controladoria que traz mês a mês deste ano a produção técnica do órgão, onde, inclusive, mostra que nossa gestão obteve resultados mais eficientes, sem contar que conseguimos implantar um procedimento ao qual a Controladoria não estava acostumada, de que era de reuniões técnicas com os órgãos que enfrentavam dificuldades. Já a terceira versão saída de dentro do Paço, de que eu me afastaria por não ter identidade com Goiânia, foi, na verdade, a mais fraca e débil entre todas, pois, a pouco vimos o prefeito anunciar, para a Secretaria de Administração de Goiânia, um nome de pessoa de fora de Goiás e que, além de tudo, enfrenta suspeitas de ter cometido irregularidades onde exerceu cargo executivo. Logo, veja que tudo o que disseram e plantaram na imprensa era mentira e não passava de estratégia para afastar um auxiliar que, por não abrir mão de exercer com ética o cargo para o qual foi convidado, estava incomodando a administração municipal.

DM - Como foi esse boicote à sua atuação?

Wagner Guimarães – Primeiro, ao chegar à Controladoria encontrei a equipe já desfalcada, com muitos servidores de férias e muitos outros que foram transferidos da Controladoria para a Comissão de Licitação. Posteriormente, alguns dias depois, o ex-controlador Andrey Salles foi até minha sala apresentar um decreto em que o prefeito de Goiânia transferia da Controladoria para a Licitação mais de dez servidores. Para um órgão eminentemente técnico e com equipe reduzida, a saída de tantos servidores de uma vez só – e claro que escolheram aqueles que estavam entre os de maior competência –, isso causa um transtorno sem precedentes. Com muito custo conseguimos contornar o entrave e buscamos dentro dos quadros da própria prefeitura outros servidores que pudessem atender as nossas necessidades.
O que mais me assustou, nesse episódio, foi a falta de consideração e respeito do prefeito, que fez o decreto de transferência de servidores sem ao menos avisar-me, deixando que a notícia me fosse dada pelo ex-controlador, que eu havia substituído, para onde, aliás, os servidores foram transferidos. Outro episódio exemplar do boicote que sofri, desde o primeiro momento, foi que a Controladoria não teve um centavo sequer de recursos financeiros durante minha gestão.
Tínhamos um caixa rotativo para pequenas despesas que encontrei zerado quando cheguei e que, ao sair, permanecia da mesma forma. Não sei a quem responsabilizar pelo fato de não ter havido transferências financeiras para o órgão, sei apenas que, apesar dos esforços que a Diretoria de Finanças da Controladoria fez, até o dia que saí do órgão não havia sido creditado.

DM – O senhor citou como causa para seu pedido de demissão os fracionamentos de despesas. Como ocorriam?
Wagner Guimarães – A lei de licitações exige que a administração, para adquirir bens e serviços, obedeça a certos procedimentos. Uma empresa privada pode adquirir, por exemplo, um carro apenas escolhendo o modelo e pagando. Já a administração pública não. Para adquirir este mesmo carro ela tem que oferecer condições para que todos os particulares, que queiram vender semelhante carro para o poder público, tenham oportunidade para fazê-lo. Por isso, quando a administração quer comprar algo é obrigada a fazer licitação. Mas esta mesma lei diz que compras de pequenos valores, até o limite de R$ 8 mil para as secretarias e de R$ 16 mil para as empresas, possam ser realizadas sem o procedimento licitatório. O que ocorre é que quando algum administrador quer beneficiar um fornecedor em particular e assim burlar a lei, a administração utiliza-se do expediente de compras repetidas de pequenos valores de um mesmo fornecedor. Por exemplo, determinada empresa pública quer comprar R$ 60 mil de, digamos, computadores, mas esse valor está acima do limite permitido para compra direta sem licitação, então, se há intenção de beneficiar algum fornecedor em particular, a licitação impediria que o administrador alcançasse seu intento.
O que o administrador mal-intencionado faz é dividir a compra em quatro processos de R$ 15 mil, comprando em quatro vezes do fornecedor que ele queria, desde o início, beneficiar. Essa prática é proibida pelo artigo 23, § 5º da Lei de Licitação e a mesma lei, no artigo 89, tipifica como crime, prevendo pena de detenção para o infrator.

DM - Esses fracionamentos ocorrem na prefeitura?
Wagner Guimarães – Pelo que vi esses fracionamentos tornaram-se fatos corriqueiros no município e, quando apontamos para o prefeito que isso vinha ocorrendo frequentemente, não vimos por parte da administração nenhuma ação que nos indicasse que iriam parar com esses procedimentos. Ao contrário, senti que ao invés de ajudar, eu estava atrapalhando. E como não mudaria meu modo de pensar e de agir, achei melhor me afastar.

“Sou contra a coligação com o PT”
Wagner não quer apoiar reeleição de Paulo Garcia. “Não podemos ser coniventes com irregularidades”, afirma

DM – O senhor viu mais algum fato de natureza grave?
Wagner Guimarães – Há um processo que a Secretaria de Educação montou para locação de brinquedos, durante o período de férias do mês de julho deste ano, que me assustou. Como o Parque Mutirama e o Zoológico de Goiânia encontram-se em reforma, a Educação achou que precisava oferecer entretenimenmento para as crianças durante o período de férias. Para isso, contratou, através de dispensa de licitação, uma empresa especializada. Ao abrir o processo, a empresa apresentou proposta no valor de R$ 500 mil, para oferecer o serviço durante o período de 30 dias. Ao assinar o contrato, fizeram-no de apenas nove dias. Então a Secretaria de Educação alterou o tempo de duração do serviço, dos 30 dias inicialmente previstos, para menos de 10 dias, sem que alterasse o valor do contrato. Mandaram o processo para a Controladoria solicitando que emitíssemos o certificado de regularidade da despesa. Negamos validar a despesa, pois o serviço não foi prestado conforme a proposta. Queriam pagar o mesmo valor de R$ 500 mil para apenas nove dias de serviço, ao invés dos 30 dias inicialmente propostos. Nossa negativa em validar o pagamento da forma que propunham gerou as mais fortes pressões, ao ponto de a secretária Neyde Aparecida trocar o contrato, que estava dentro do processo e que já havia sido apreciado e negado pela Controladoria, por outro, desta vez com validade de julho a agosto. Trocou o contrato e queria que tirássemos nossas manifestações e finalmente aprovasse a despesa. A secretária Neyde, pessoalmente, me levou o processo, sem ao menos mandá-lo por protocolo, ou colocá-lo no sistema. Neste dia, entreguei o processo e minha demissão ao prefeito de Goiânia, Paulo Garcia.

DM - O senhor tem provas destes fatos?
Wagner Guimarães – Está tudo documentado, tenho cópias dos despachos de antes do contrato ser trocado e de depois da substituição. Se hoje voltaram os contratos não sei, pois o prefeito deve ter encaminhado o processo para as mãos da secretária, de quem recebi. Quanto aos fracionamentos, trouxe exemplos de aquisições, com número dos processos, datas e valores das aquisições realizadas por uma das empresas do município e de uma das secretarias. Caberá aos órgãos fiscalizadores a responsabilidade de apurar a quanto remonta esses fracionamentos. Que existem está provado. Que são graves estas práticas também está comprovado. Se haverá interesse em apurá-los, aí já é outra história. Isto fica com a sociedade e com quem tem atribuição legal para tanto.

DM – O que o motiva a tornar público esses fatos?
Wagner Guimarães – É que estou, aliás, a nação está cansada de ver acontecer fatos que vão sendo varridos para baixo do tapete. É inconcebível e inaceitável que continuemos a nos fazer de cegos, a permitir o loteamento das administrações para partidos, sem que os critérios de moralidade e eficiência sejam os definidores. Tome como exemplo a troca do secretário de Administração de Goiânia. Não se levou em conta se quem assumiu era alguém comprometido com o Estado, ou com a cidade, ou se era ao menos honesto, apenas visou garantir votos de uma determinada religião, como se Deus, por isso, fosse administrar a cidade. Olhe o que acontece no governo federal, que em nome da governabilidade, nossa presidenta demite ministros, mas permite a troca por nomes do mesmo partido e mantém nos ministérios pessoas que talvez não sejam ruins, mas que estão comprometidas com os mesmos esquemas de sustentação eleitoral e econômica dos ministros demitidos anteriormente. A perpetuação da corrupção no Brasil está ligada a estas negociações eleitorais, a essa inversão de valores, onde o esperto, o endeusado é quem consegue se locupletar do dinheiro público. Temos de dar um basta nessa inversão de valores, a sociedade precisa ter a coragem de romper com estes esquemas. Senti-me no dever de trazer a público estes fatos para, talvez, contribuir com a tomada de consciência e mostrar que nem todos os que fazem política são ruins.

DM – O senhor é vice-presidente do PMDB e, como tal, tem responsabilidades partidárias. O PMDB tem anunciado que apoia a reeleição de Paulo Garcia e, inclusive, fez intervenção no Diretório Municipal de Goiânia para garantir a coligação. Qual sua posição diante de todos estes fatos que narrou?
Wagner Guimarães – A partir de agora sou contra a coligação PT/PMDB, que tenha como candidato a prefeito o senhor Paulo Garcia. Defendo que o PMDB, partido que deve sua origem à Pedro Ludovico, que também fundou Goiânia e onde temos o carinho da população que sempre nos acompanhou, se afaste da atual administração e tenha candidatura própria, lutando para resgatar os princípios de ética e de moralidade à frente de nossa Capital. Temos compromissos históricos com a cidade e não podemos fechar os olhos e fazer de conta que nada esta acontecendo. Participar de uma administração que comete tais irregularidades é ser cúmplice e significa trair a história de amor e carinho que, ao longo dos tempos, construímos com a Capital de nosso Estado.

DM - Saindo da administração de Goiânia e disputando sem o PT, o PMDB teria como vencer as eleições?
Wagner Guimarães – O que não podemos é, em nome de vencer eleições, ser coniventes e partícipes de irregularidades. Eleição não se vence ou perde-se de véspera, ela é disputada e temos bons nomes. O compromisso de um partido não pode ser só com o poder pelo poder, a legitimidade dele é alcançada pela forma como o exercemos. O Brasil está cansado de tantos desvios éticos, a população não aguenta mais ser pisoteada e enganada. É hora de termos coragem de assumir posições e mostrar que é possível avançar, sem atropelar a honra e os compromissos com a população e a lei. Se for para ser conivente com bandalheiras, melhor não exercitar a arte da política. Não me coloco entre os que acham que tudo pode em nome da conquista. O PMDB, sendo o maior partido do Brasil, como tal deve se posicionar frente ao grande desafio do resgate da ética e da cidadania.

DM - E se o PMDB não concordar com o senhor?
Wagner Guimarães - Terei de pensar como me posicionar e até mesmo na hipótese de me afastar da política partidária, pois não deixarei de lado os conceitos que procurei exercer durante toda minha vida. Se o que penso estiver em desacordo com as lideranças de meu partido, então, talvez tenha chegado a hora de não ter mais líderes.

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