Fogo deixa rastro de perdas para produtores em Goiás

Produtores rurais calculam os prejuízos para a próxima colheita de grãos


Depois de 130 dias, choveu em Goiânia. No interior do Estado, a chuva chegou primeiro. Mas para os produtores rurais, a mudança no clima não foi suficiente para amenizar os prejuízos causados pelas queimadas dos últimos meses. Valdemar da Mota Neto, 44 anos, viu 120 hectares de cana-de-açúcar pegarem fogo em sua propriedade, em Santa Helena de Goiás, e diz que, com a pouca umidade no ar e o vento forte, a plantação foi consumida pelas chamas em poucos minutos. 

Há cerca de um ano, Valdemar plantou cana em sua fazenda com o objetivo de iniciar a produção de soja dois anos depois, quando a terra tivesse palhada e nutrientes suficientes para receber o grão. “Foi decepcionante. Fiquei arrasado. Faltava mais um ano para começar a plantar a soja. Quando o fogo começa, não é possível fazer mais nada para salvar a produção”. 

Valdemar afirma que ainda não é possível estimar o prejuízo exato causado pela queimada em sua fazenda, mas estima perda de R$ 4 mil por hectare, cerca de R$ 480 mil no total. O produtor não sabe ao certo onde começou o incêndio que chegou à sua propriedade, mas o mais provável é que sua plantação tenha sido atingida pela queimada que teve início em outras fazendas. 

Irmão de Valdemar, Ricardo Mota, 41 anos, é produtor de grãos há mais de 10 anos em Santa Helena de Goiás. A fazenda dele também foi atingida por um incêndio há cerca de 15 dias, quando 90% da palhada – vegetação e resto de outras colheitas que protegem o solo – pegou fogo. “O primeiro sentimento é de impotência, por não conseguir fazer nada. Dá muita tristeza, porque o prejuízo é grande”, afirma Ricardo. Com a perda de nutrientes no solo, o produtor diz que pode deixar de colher até 12 sacas de soja por hectare na próxima safra. 

O vento forte também espalhou rapidamente o fogo pela propriedade de Rodrigo Proto, 39 anos, produtor de grãos no município de Rio Verde. O incêndio chegou, inclusive, próximo à casa principal da fazenda, mas ninguém ficou ferido. O fogo consumiu 260 hectares. 

O prejuízo de Rodrigo também foi com o incêndio em palhada, o que deve levar a consequências na próxima colheita. “Tem a perda e também o transtorno, porque a fazenda para”, conta o produtor. Rodrigo diz que a principal suspeita é que o incêndio tenha começado com a saída de fagulhas do escapamento de um dos tratores utilizados na propriedade rural. 

Perda
O presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Goiás (Aprosoja-GO), Adriano Barzotto, explica que a queima da palhada pode gerar perdas até nas próximas duas colheitas de grãos. 

“Essa camada é fundamental para manter a temperatura do solo baixa. Ao iniciar o ciclo da plantação, a terra precisa estar mais fria. A palhada funciona como uma espécie de escudo para a primeira fase da soja ou do milho. Sem isso, a produção é menor”, explica. 

A Aprosoja estima que cerca de 100 mil hectares de palhada pegaram fogo em Goiás nos últimos meses. Adriano diz que os produtores devem perder cerca de oito sacas de soja por hectare. Levando em consideração que uma saca de soja é vendido por cerca de R$ 70, o prejuízo pode passar de R$ 55 milhões. 

Apesar de a chuva ter chegado ao Estado na semana passada, Adriano diz que a mudança ajuda a minimizar o problema, mas não soluciona o embaraço dos produtores que perderam a palhada. “O que queimou está perdido. A chuva ajuda a fixar a cinza no solo, então a terra consegue absorver algum nutriente. Agora, vai nascer capim, mas não dá tempo de formar outra camada de proteção”, afirma Adriano. 

Estatística divulgada pelo Corpo de Bombeiros aponta que foram registrados 180 incêndios em cultura agrícola no Estado de janeiro a agosto de 2019. No mesmo período do ano anterior, foram 112 ocorrências. O aumento é ainda mais expressivo no mês de agosto de 2019, quando Goiás teve 95 incêndios em plantações. Em agosto de 2018, o Corpo de Bombeiros registrou 53 ocorrências do tipo. 

De acordo com o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), José Mário Schreiner, o produtor deve utilizar mais insumos ao iniciar o plantio, mas a opção faz com que o processo fique mais caro. “O produtor rural é a grande vítima da queimada. Foram formadas brigadas de incêndio no interior, organizaram comboios de caminhões com água, mas não foi suficiente. O prejuízo é enorme”, afirma José Mário. 

Políticas
O secretário de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Antônio Carlos de Souza Lima Neto, também aponta o maior prejuízo para a próxima safra de grãos do Estado. “Tivemos focos de incêndio em praticamente todo o Estado. Muitos produtores se uniram localmente para combater as queimadas. Mas é uma catástrofe com danos irreparáveis aos produtores, que acabam assumindo mais um prejuízo”. 

Questionado sobre auxílio do Estado durante os incêndios, o secretário alegou que as queimadas são acidentais e imprevisíveis, mas afirmou que o governo estadual esteve presente “para tentar amenizar a situação”.

Compartilhe

Comente: Fogo deixa rastro de perdas para produtores em Goiás